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O Casamento Homoafetivo ainda não está garantido no Brasil: a Resolução nº 175 do CNJ não tem efeito vinculante para o Ministério Público e para os Juízes de Direito

Letícia Franco Maculan Assumpção

Artigo – O Casamento Homoafetivo ainda não está garantido no Brasil: a Resolução nº 175 do CNJ não tem efeito vinculante para o Ministério Público e para os Juízes de Direito – Por Letícia Franco Maculan Assumpção

 

Na quarta-feira (15/05/2013) o Conselho Nacional de Justça – CNJ fez publicar a RESOLUÇÃO Nº 175, DE 14 DE MAIO DE 2013, nos termos da qual é vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo.

Ainda nos termos da referida Resolução, a recusa por parte das autoridades competentes implicará a imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis.

O que se entende por “autoridades competentes”? As autoridades competentes de que trata a resolução são os Oficiais de Registro Civil e os Juízes de Paz.

O CNJ uniformizou as regras para os Cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais de todo o país. Assim, o Oficial de Registro, que é um agente público, no exercício da função pública a ele delegada pelo Estado e que se submete às normas técnicas estabelecidas pelos órgãos competentes do Poder Judiciário, nos termos do que determina a Constituição da República (art. 236, § 1º) e a Lei dos Notários e Registradores (Lei nº 8.935/2004, art. 30, XIV), deverá obedecer à Resolução do CNJ.

Os Juízes de Paz, que são agentes públicos a quem cabe a celebração do casamento, nos termos do art. 98, II, da Constituição da República, também têm que observar a Resolução nº 175, do CNJ, mesmo porque a mencionada resolução fez expressa menção a “autoridades competentes” e a “celebração do casamento civil.”

Portanto, no âmbito administrativo, a questão está solucionada. A partir de 16 de maio de 2013, os Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais não podem deixar de receber os processos de habilitação para casamento apresentados por casais homoafetivos e os Juízes de Paz não podem se negar a celebrar casamentos homoafetivos, sob pena de comunicação ao Juiz Corregedor para as providências cabíveis.

Ressalte-se que a maioria dos Oficiais brasileiros já vinha entendendo que, desde o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal – STF da ADPF 132 e da ADI 4277, em maio de 2011, já era possível receber os processos de habilitação para casamento homoafetivo. A interpretação dos Oficiais é no sentido de que, se o STF entendeu que a União homoafetiva é entidade familiar e dela decorrem todos os direitos e deveres que emanam da união estável entre homem e mulher, seria possível a conversão em casamento da referida união estável. É o que decorre da leitura do art. 226, § 3º da Constituição da República, cujo conteúdo é no sentido de que, para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

Ora, se a união estável homoafetiva pode ser convertida em casamento, não há motivo para se negar o pedido de habilitação para casamento, pois os efeitos de ambos os procedimentos é o mesmo: o casamento civil.

Desta forma, a grande maioria dos Oficiais já vinha recebendo processos de habilitação para casamento homoafetivo. No entanto, não basta hoje, mesmo após a publicação da Resolução nº 175, do CNJ, que o Oficial receba o processo de habilitação. O Código Civil rege o processo de habilitação para casamento. Após o Oficial receber a documentação exigida por lei, deve obrigatoriamente encaminhar ao Ministério Público o processo para parecer (art. 1.526 do Código Civil). Ressalte-se que o Ministério Público não está vinculado à Resolução nº 175 do CNJ. O Ministério Público é órgão independente – não há relação de hierarquia entre o CNJ e o Ministério Público.

Como bem informa Ruy Rosado de Aguiar Júnior: “O Ministério Público é órgão constitucional autônomo, tanto formal quanto materialmente, porque exerce sua função, indispensável à vitalidade do Estado, de forma independente e insubordinada a outro órgão.”

Em razão da referida independência, o Promotor que emitirá parecer no processo de habilitação pode entender que a decisão do STF na ADPF 132 e na ADI 4277 não se aplica ao casamento. Isso porque tais decisões trataram da união estável e não do casamento, demandando interpretação do aplicador da lei para se chegar ao entendimento de que o casamento homoafetivo é permitido. O Direito é uma ciência que admite a interpretação e o promotor pode se posicionar por uma interpretação mais restritiva.

Ainda nos termos do Código Civil (art. 1.526, parágrafo único), se o promotor impugnar o processo de habilitação para casamento homoafetivo, deverá o processo ser submetido ao Juiz de Direito competente (Juiz da Vara de Registros Públicos, onde houver, ou Juiz da Vara Cível a quem for atribuída a competência pelas normas estaduais).

O Juiz de Direito também não está vinculado à decisão administrativa expedida pelo CNJ. O Juiz tem o seu livro convencimento e também pode dar uma interpretação restritiva à decisão do STF na ADPF 132 e na ADI 4277.

No caso de haver decisão do Juiz de Direito indeferindo o pedido de habilitação, o casal homoafetivo terá que constituir advogado e recorrer ao Tribunal de Justiça do Estado para que o pedido seja examinado em segunda instância. Ainda não há posicionamento do TJMG sobre o tema.

O presente artigo tem o objetivo de alertar os cidadãos sobre essa questão, que pode criar alguns transtornos para o casal homoafetivo.

Em Belo Horizonte, no entanto, segundo informação verbal da Juíza da Vara de Registros Públicos, o entendimento é no sentido de que a melhor interpretação da Constituição da República é no sentido da possibilidade do casamento homoafetivo, posição que também é a defendida pela autora do presente artigo.

Letícia Franco Maculan Assumpção – Oficial do Registro Civil com atribuições Notariais do Distrito do Barreiro – Comarca de Belo Horizonte

 

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